08, 09, 10 & 11

ILUSÃO & ANSIEDADE

Alguns precisam de uma ilusão para crer. Outros, de uma crença para se iludir.

Iludido o jovem é por definição, ou melhor, por momento histórico evolutivo, digamos. Mas todos estamos iludidos em alguns tantos momentos de nossas vidas, se não em função do tempo, em função de nossas circunstâncias.
Ilusão é a sensação (ou esperança) de que tudo há de sair a nosso jeito por obra do além ou vontade própria. A ilusão é a mola que nos lança para o desconhecido. A ilusão é irresponsável porque dissociada de qualquer senso de bom senso. Mas é a ilusão que nos faz criadores, contestadores, rebeldes, empreendedores, empresários, enfim. Ilusão é a companheira presente em nossas noites. Que nossas amantes não se sintam enciumadas.
Não se pode esperar um empreendedor que não tenha sido filho da ilusão.  Mas a ilusão não tem qualquer importância no sucesso de um negócio. Ao contrário, ela é o alicerce de insucessos retumbantes. A ilusão, como esteio da empreitada de se montar o próprio negócio (de qualquer porte), é assassina.
Sabichão que tenta empreender com ilusão colhe juventude perdida e perdas financeiras. E se Desavisado já chegou à meia idade, arrisca perder o que amealhou em anos de trabalho.
Ainda não descobri qualquer utilidade para a ilusão no ambiente de negócios, especialmente quando Você precisa se concentrar em manter seu pescoço de fora, sem direito a errar. Tentar ser competente, tomar o maior número possível de decisões acertadas, se safar das armadilhas de seu novo e estranho meio ambiente, sobreviver a despeito de seus predadores - que Você nem sabe quais são -, esse será seu dia-a-dia.
Não desvie o olhar do que não quer ver. Não se sacaneie. O “me engana que gosto”, consciente, subconsciente ou inconsciente, é perigoso. Ser informado sobre o mundo real pode parecer castrador, mas não comece solapando suas chances de sucesso. Não se iluda, não abra mão de conhecer as dificuldades, a realidade do tipo de negócio que quer montar. Não considere suposições como verdades. Otimismo (ou sua versão piorada, o pessimismo) é para ignorantes (aqueles que ignoram). Para profissionais, para quem tem compromisso em fazer a coisa certa, só interessa saber os fatos mais prováveis no tal do mundo real. Mesmo que virtual.
Acredite, não é retórica. São muitos anos de poucos altos e muitos baixos. A dor que sinto no pescoço é exatamente por ficar tentando manter a cabeça de fora. Ainda não cheguei porque estamos sempre caminhando. E se continuo caminhando, é porque me despi da ilusão. Levou algum tempo. Se tivessem me avisado teria ficado nu mais cedo!
A ansiedade domina todos nós quando queremos ver realizado o que se deseja. Ela se manifesta na espera da resposta à entrevista a um emprego. Na expectativa do resultado do vestibularNo zunzunzum sobre a próxima leva de demitidos. No altar, aguardando a entrada da paixão de nossa vida. A ansiedade nos domina quase o tempo todo e, no caso específico do empreendedor, especialmente:
a.      Nos dias que não passam, às vésperas da inauguração do próprio negócio.
b.      Enquanto espera o primeiro Cliente; o segundo; o terceiro...
c.       Durante todo o dia dos primeiros dias, subtotalizando vendas a cada hora.
d.     Quando o lucro não vem.
e.      Quando o prejuízo não pára.
f.        Quando aparece um concorrente.
g.      Quando desaparece o Cliente.
h.      Em muitas e muitas outras ocasiões.
A ansiedade é inerente à expectativa de viver o que é desejado, mas desconhecido. Quando exagerada, não é boa companheira, mas em dose adequada é o que nos tira da inércia. Sendo inevitável, nos resta compreendê-la. Se Desavisado não a compreende, se torna (ou se mantém) um ansioso compulsivo, aquele que sofre antes de haver sofrimento. Infelizmente, entre empreendedores de primeira empreitada, esse é o tipo mais comum. O jovem é um ansioso exagerado porque ainda não tem referências para ancorar suas certezas. Ele não tem convicções sólidas sobre coisa alguma. Tudo é muita interrogação. E para superá-las, nada melhor que projetar uma imagem de auto-suficiência. É o paradoxo da juventude.
Ansiedade exagerada vira angústia. Há quem fique dias deitado, olhando para o teto, coçando a testa, cozinhando a angústia e deixando de fazer o que é preciso. Ansiedade paralisadora se combate com informação. Se isso não bastar para Sabichão, um bom psicólogo dará um jeito. Vai custar menos do que as conseqüências da ansiedade exagerada. Domine-a para não ir todo dia para a cama com Angústia. Sua amante e seu negócio não vão gostar.
Conselho:

Livre-se da ilusão e ajuste a chama da ansiedade para fogo brando.



DESTINO & ACASO

Abriu uma loja em um shopping recém inaugurado. Não considerou que seu sucesso estaria vinculado ao sucesso do próprio shopping. E shoppings, como todo consumidor sabe, demoram a vingar, adquirir um perfil, ganhar massa crítica. Depois de meses, o shopping aos fantasmas, quando já perdera tudo e preste a desistir, o incorporador consegue trazer uma loja âncora e, tal como anjos do céu, caem em sua loja clientes aos empurrões. Puro acaso. Mais um mês e o agora dado como destino ou prêmio pela determinação, seria mais um fracasso a contar nas estatísticas.

Se Você não gostar do que estiver lendo, passe para o próximo capítulo. Não é minha intenção questionar as crenças de ninguém.
Para mim, a sorte só existe como acaso, não como as pessoas a entendem. “O Zé é um cara sortudo!” porque namora uma garota de fechar o trânsito é só uma exclamação invejosa. Este mesmo Zé vem jogando na mega-sena faz anos e não faz triplo!
Tal como sorte (ou azar), o destino - no sentido popular de acontecimento pré-programado, pré-determinado, também não existe. A história de todos sermos pecadores é uma proposição dada às pessoas para poderem conviver com a morte inevitável – o fracasso da vida – para 100% da humanidade. Acreditar num destino do qual não se pode desviar, é, no caso, inevitável. E mais confortante. Afinal, quem escolheria a morte se lhe fosse dado o direito de escolha? Não é lógico. O destino, como responsabilidade terceirizada, é.
Para mim a vida é uma louca, interminável, intensa, surpreendente seqüência de acasos. Considerado o instante em que um determinado esperma de meu pai encontrou um óvulo de minha mãe, sou fruto de um acaso em uma seqüência que se tivesse havido alguma mínima mudança meu irmão teria nascido, não eu.
A atitude de Sabichão tem relação com o que pode vir a lhe acontecer no futuro, mas não é determinante deste futuro. Determinante é o acaso. O povo diz que “Deus ajuda quem cedo madruga”. Se entendermos o madrugar como uma preparação, tudo bem, pois a sorte (ou o azar) vem para quem está no caminho de um dado acaso e se para Desavisado acaso bom for mais provável ocorrer às 4 da manhã, então acerte o despertador. Mas todos estamos no caminho de milhões de acasos, quer acordemos às 4, 6 ou 10 da manhã.
Por puro, puro acaso, encontrei a morena que está ao meu lado até hoje. Entre um bilhão de acasos que poderiam ter acontecido, aquele um foi o que orientou o resto das minhas escolhas em relação à minha vida amorosa e familiar. Se eu tivesse acordado 5 minutos mais tarde; se ela tivesse adoecido e não ido à escola aquele dia; se o ônibus tivesse passado um pouco adiantado, ou um pouco atrasado; se... se... se...
No tsunami do Natal de 2004, as pessoas que morreram arrastadas pelo maremoto escolheram estar onde estavam, mas não escolheram estar no caminho daquela super onda. Elas não foram arrastadas para a morte por serem pecadoras e merecedoras do inferno. O movimento da placa tectônica que a gerou não é uma entidade com consciência que esqueceu que coisas desse tipo não deveriam acontecer a pessoas curtindo férias. Tudo obra do acaso. Elas estavam no lugar errado, na hora errada. Estavam no caminho das conseqüências de um evento que teve origem em uma seqüência de acasos geológicos, até mesmo, cósmicos. Com isso quero dizer que suas escolhas vão levá-lo para mais perto ou mais longe de certos acasos (probabilidades de eventos). Ir morar ao sopé do vulcão Etna não é uma boa escolha. Sua probabilidade de morrer torrado sob um rio de lava ficará bastante aumentada.
De início, a probabilidade de sua empreitada é de dar errada, porque seu despreparo coloca-o no caminho de muitos acasos desfavoráveis. Quanto mais preparado Desavisado estiver, melhores suas circunstâncias e menor sua probabilidade de enfrentar acasos desfavoráveis. Mas estamos falando de probabilidade e não de certeza. Nem mesmo é certo que fracassará se for um incauto total, um despreparado convicto. Quem sabe se o acaso dos números inscritos nas seis bolinhas que caírem do globo de arame em um determinado sorteio da mega-sena não venham a ser exatamente os seis números marcados no seu volante? A única certeza é que o ganhador será, invariavelmente, alguém que jogou, que se colocou no caminho deste específico acaso. Eu, como outros, jogo a mesma seqüência de números sempre. Esta técnica é a prática do que acabamos de falar. Ela se justifica porque:
1.      O sorteio pode dar qualquer seqüência de números e nenhuma é mais provável.
2.      Uma dada seqüência, por probabilidade estatística, irá ocorrer um dia. Enquanto eu vivo ou depois de morto, mas se acontecer enquanto eu vivo, vai me encontrar acenando com o bilhete na mão.
Sua determinação, suas ações e decisões, sua capacitação, sua automotivação, tudo isso é necessário para tocar seu negócio. Mas sem acasos favoráveis, Sabichão não alcança. E em negócios, alcançar, ter sucesso, advém de se estar no lugar certo, na hora certa, com o produto (ou serviço) certo, no preço certo.
Conselho:

O único destino é o de nossas vidas depender de acasos. Perceba os que lhe são favoráveis (oportunidades) e tire o melhor proveito.



DETERMINAÇÃO & CIRCUNSTÂNCIAS

Junto ao posto, o Hans já tinha a lanchonete/bar que patinava em fiéis e 
não-rentáveis clientes do café da manhã e do happy hour[1]. Construiu um restaurante ao lado de seu Beco do Alemão e perdeu dinheiro e cabelos tentando fazer vingar restaurantes diversos: de comidas típicas, pizzaria, churrascaria, comida internacional a la carte etc. Além de moscas, nada. Até o dia... Bem, um dia as circunstâncias lhe trouxeram um pessoal do sul propondo montar um restaurante por quilo. E não é que aquilo funcionou? E funciona até hoje, com distribuição de senhas para controlar a fila de espera!
Determinação é como ingerir líquido. Não se discute se uma pessoa deve ou não ingerir líquido diariamente. Se não o fizer, morre.  No empreendedorismo, a conseqüência é a mesma. Se Sabichão não tiver determinação, quebra. Rápido e simples assim.
Você tem personalidade compatível com o conceito por trás da palavra determinação? Tem estrutura emocional para levantar tantas vezes quantas vezes cair? Porque Você vai cair. Porque suas pernas vão tremer. Labirintite causada por tensão extrema vai ser coisa comum. Se Desavisado não tem esse nível de determinação, não se preocupe. Tal como qualquer outra característica da personalidade, uns têm, outros não. São poucas as pessoas dispostas a pagar um preço tão alto por um objetivo de riqueza tão improvável de ser alcançado. Talvez Você deva se dedicar a ser feliz de outros modos.
Tal como a água, determinação é necessária, mas não suficiente para garantir sucesso empresarial. Com determinação Você caminha, mas não alcança. Se Sabichão pensa diferente, se acha que tudo há de se dobrar à sua vontade inabalável, vou lhe adiantar de modo claro o que vai aprender tomando cascudo da vida: o mercado não está nem aí para seus sonhos. Visto de outro ângulo: os seus interesses são incompatíveis com os interesses do mundo real porque este é a expressão prática da determinação conflitante de milhões de competidores. Amargo? Não está gostando? Ainda estamos no tira-gosto!
Para nós, protagonistas da vida, mundo real é o conjunto das conseqüências das ações individuais de uma multidão de outros protagonistas. Mundo real é o conjunto dos interesses egoístas, personalistas que, em moto-contínuo, fazem a vida acontecer. Neste ambiente, seus desejos são incompatíveis com os desejos de seu próximo: sócio, empregado, concorrente, fornecedor e Cliente. A regra geral é que Desavisado tem banana para vender, quando seu Cliente quer laranja, seu fornecedor só tem abacaxi, mas seu concorrente da esquina é o dono do laranjal.
Se determinação é fator básico, o que faz diferença são as circunstâncias.  “O homem é o homem e suas circunstâncias”, disse Ortega y Gasset. De que são fruto suas emoções? Suas dores? Seus prazeres? Quantas circunstâncias criamos e quantas nos são impostas? Quais nos expõem a acasos favoráveis? Quais nos incomodam? Quais testam nossa fibra? Quais nos levarão a derrotas sem piedade?
Circunstâncias... há que percebê-las. Há que a elas se adequar se aparentemente favoráveis ou, ao contrário, delas se afastar. Somos agentes das circunstâncias e objetos passivos eternos dos acasos. Quanto mais capacitados, mais aproveitadores somos de nossas circunstâncias. Quanto menos, mais as circunstâncias favoráveis a outros darão origem a nossos infortúnios. E quanto melhor a percepção da origem das circunstâncias, mais aptos estaremos para fazê-las funcionar a nosso favor. A determinação precisa das circunstâncias, sem elas, a determinação é burra. É coisa de Desavisado cabeça-dura e Sabichão turrão.
Conselho:
Tenha como sina criar ou se aproximar de circunstâncias favoráveis.





[1] Happy hour, expressão da lingual inglesa. Na tradução literal, “hora feliz”, mas pode ser entendida como um aviso de que é hora de voltar pra casa. Se você tiver juízo.



INVEJA & CAPACITAÇÃO

Depois de 20 anos trabalhando em uma atividade autocentrada, sem ter que lidar com este ser chamado Cliente, “cansado desta profissão estressante”, por circunstâncias diversas alimentou a idéia de virar exportador de produtos brasileiros. Afinal, todos os seus amigos empresários pareciam viver uma vida feliz e promissora! Identificou algumas oportunidades e, por um ano, viajou pra lá e pra cá exaurindo economias em tentativas de cruzar fornecedores gananciosos e clientes sovinas. Ao final, retornou àquela “profissão estressante”, sim, mas para a qual, ao longo dos anos, se tornara totalmente capacitado.
Todos nós, durante a vida profissional, tivemos, temos e teremos espasmos da síndrome do “estou de saco cheio disso tudo”. A maioria de nós fica só no espasmo e segue a vida. Mas alguns estão de “saco cheio” mais que os outros e vão às vias de fato. Mal começo! Esse não é um bom motivo para Sabichão deixar seu emprego e se arriscar como empresário. O maior patrimônio de Desavisado não é quanto dinheiro tem, é o que já sabe fazer. Quão habilitado Você está para atuar no mercado escolhido? Esta é uma boa primeira pergunta. A resposta é o que chamo de capacitação. Seu risco sempre será inversamente proporcional ao seu nível de capacitação. É preciso estar capacitado. Capacitação é mais que um patrimônio. É vantagem competitiva.
Estar capacitado diz respeito às premissas para abrir um negócio. Exemplo? Sabichão pode ter capital e se associar a quem tem capacitação. Ou Desavisado pode ser o único dono, mas com capital para contratar os melhores profissionais no mercado. Enfim, é o negócio que precisa estar tecnicamente capacitado para atuar em um determinado ambiente empresarial. Não necessariamente Você.
No que interessa ao sucesso de uma iniciativa empreendedora, recurso financeiro só se torna patrimônio se transformado em conhecimento relevante e valioso para o que Sabichão tem intenção de fazer. Para um soldado, patrimônio poderá ser um destemor acima da média. A firmeza das mãos, por certo, será um patrimônio valioso para o cirurgião. Para um vendedor, a facilidade com que ganha a simpatia das pessoas tem relação direta com seu desempenho em vendas. A mão inversa desta proposição é que qualquer capacitação de Desavisado, herdada ou adquirida, só será patrimônio se aplicada na situação adequada. Sabe por que iniciativas empreendedoras dão certo para pouquíssimos e errado para muitíssimos? Falta de adequação entre capacitação e natureza do negócio.
Uma razão que percebo muito freqüente na decisão de investir na montagem de um próprio negócio é o sucesso alheio. Inveja pura. Desavisado inveja o sucesso do outro que ele imagina ter sido rápido. Passa na banca de jornal e vê a capa da revista com a foto do mais novo milionário da internete e se pergunta “por que não eu?”. Já Sabichão inveja relatos de executivos que, depois de juntar um milhão de dólares, abandonaram suas sólidas carreiras para montar uma, “não tem erro”, franquia do McDonald’s.
Se a maioria dos pequenos negócios não vinga, uma das razões é a motivação invejosa. Mesmo para profissionais capacitados, a inveja faz seus estragos. Ela pode vir de Sabichão, um técnico que, estando empregado, tem a percepção de ser a alma da empresa e todos os demais “uns inúteis”, nada, portanto, impedindo-o de mandar todos às favas e ser seu próprio patrão. A inveja também pode vir de Desavisado, o funcionário de uma empresa com imagem já solidificada no mercado, com clientela fiel e constante, e que, de repente, tem a percepção de que “é muito fácil, o que estou fazendo aqui?”, porque “não abro meu próprio negócio?”.
Conselho:

Antes de abrir um próprio negócio em uma atividade que Você não conhece, vá trabalhar nela como empregado. Poupa dinheiro e evita frustrações.

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